quinta-feira, 29 de março de 2018

'BOCA DE OURO'

No palco, três versões para o mesmo crime

Diretor Gabriel Villela incorporou novos elementos na montagem da obra de Nelson Rodrigues

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Gabriel Villela
Veterano. Gabriel Villela já havia feito versões de “A Falecida” e “Vestido de Noiva”, ambas de Nelson Rodrigues
PUBLICADO EM 16/03/18 - 03h00
O mineiro Gabriel Villela já havia se debruçado anteriormente sobre o universo rodriguiano. “No plano profissional, primeiramente fiz ‘A Falecida’ (1994), com a Maria Padilha, e, depois, ‘Vestido de Noiva’ (2009), com Marcello Antony, Leandra Leal e grande elenco”, rememora o diretor, que também se tornou conhecido por seu trabalho junto ao grupo Galpão.
Mas Villela lembra que, tendo tido Sábato Magaldi (1927-2016) como mestre, “não poderia ter ficado restrito somente às 17 peças do Nelson”. “Quem estudou com ele sabe que tinha que partir para as obras completas de Nelson Rodrigues – ‘A Vida como Ela É’, só para citar um exemplo”, explica.
E o que fascina tanto o diretor no universo do dramaturgo, morto em 1980, aos 68 anos? “Bem, ninguém fechou questão tão bem, em duas, três palavras, sobre a ética, a gene emocional e suburbana do homem brasileiro. O próprio Sábato dizia muito – e deixou escrito isso em letras colossais – que, com o advento de Nelson Rodrigues, o teatro brasileiro perde de vez seu complexo de inferioridade. Isso é uma grande verdade. Foi maior que todos nós, que nossos tempos. É verdade”, afirma.

Criação. Sobre a nova montagem de “Boca de Ouro” (o texto já foi adaptado também para o cinema), Gabriel Villela lembra que cada construção de um espetáculo, “da logística cênica, da linguagem cênica”, de alguma maneira traduz o pensamento do homem de seu tempo. “Por exemplo, ao dar três versões distintas de um mesmo fato, fomos pautados em cima do que, à época (do processo de montagem), estava então se construindo com o título de ‘fake news’ – muito embora, no caso da nossa Dona Guigui, protagonista da peça, ela dê essas versões (da morte do bicheiro Boca de Ouro) a partir de três impulsos emocionais internos, psicológicos. Muito diferente da vulgaridade das fake news de hoje, que se desmontam no dia seguinte – ou até no mesmo dia – nas redes sociais”.
O diretor lembra que, ainda no processo que precedeu a montagem, ele e companheiros de projeto leram o texto “Rashomon”, “filmado por (Akira) Kurosawa (1950), que também são três pessoas contando a história de um mesmo assassinato”. “Cada um adicionando, adulterando (a versão), bifurcando, criando uma logística com a literatura até então quase desconhecida – embora Pirandello também tenha feito isso, muito bem, no começo do século XX”, acrescenta ele.
Para Villela, a grande façanha da montagem é colocar as três mortes “dentro de três distintas formas de fazer poesia cênica”. “E a música – pungente, brasileira – costurando tudo, com tanta delicadeza, pelo canto da Mari (Mariana Elisabetsky). Ah, e também um elenco formoso, com o Malvino (Salvador) fazendo, numa primeira versão, um homem de luta, de guerra, de briga; no segundo, um lorde inglês, e, no terceiro, um deus inca”, pontua.

 

Trilha sonora

FOTO: DIVULGAÇÃO
Nana Caymmi
“A Noite do Meu Bem” (Dolores Duran, 1959)
Ouça: Nana Caymmi, em “A Noite do Meu Bem: As Canções de Dolores Duran”
FOTO: DIVULGAÇÃO
Maria Bethânia
“Vingança” (Lupicínio Rodrigues, 1951)
Ouça: Maria Bethânia, em “Memória da Pele”
FOTO: DIVULGAÇÃO
Gal Costa,
“Ave Maria no Morro” (Herivelto Martins, 1942)
Ouça: Gal Costa, em “Todas as Coisas e Eu”
FOTO: DIVULGAÇÃO
Cassia Eller
“Na Cadência do Samba” (Ataulfo Alves e Paulo Gesta, 1962)
Ouça: Cassia Eller, em “Cassia Eller”
FOTO: DIVULGAÇÃO
Waldir Azevedo
“Brasileirinho” (Waldir Azevedo, 1949)
Ouça: Waldir Azevedo, em “Os Grandes Sucessos de Waldir Azevedo”
FOTO: DIVULGAÇÃO
joão bosco
“De Frente pro Crime” (João Bosco e Aldir Blanc, 1974)
Ouça: João Bosco, em “Caça à Raposa”
FOTO: DIVULGAÇÃO
CAETANO VELOSO
“Cidade Maravilhosa” (André Filho, 1934)
Ouça: Caetano Veloso, em “Certeza da Beleza”
 http://www.otempo.com.br/divers%C3%A3o/magazine/no-palco-tr%C3%AAs-vers%C3%B5es-para-o-mesmo-crime-1.1585298

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