sábado, 22 de agosto de 2015


Celso Frateschi encarna Próspero em 'A Tempestade', de Shakespeare

Espetáculo em cartaz em São Paulo tem direção de Gabriel Villela

Celso Frateschi vive Próspero, um duque usurpado de seu poder pelo irmão (Foto: João Caldas)Celso Frateschi vive Próspero, um duque que tem o poder usurpado pelo irmão (Foto: João Caldas)
Depois dirigir quatro textos de Shakespeare – “Romeu e Julieta”, “Sonho de uma Noite de Verão”, “Macbeth” e “Sua Incelença Ricardo III” – Gabriel Villela tornou-se quase um especialista no bardo. Contribuindo para sua expertise, o diretor apresenta a partir deste fim de semana em São Paulo sua versão de “A Tempestade”, último texto escrito pelo dramaturgo inglês. Características shakespearianas não faltam à comédia. Estão lá os clássicos confrontos de família, disputas pelo poder e amores impossíveis. O ator Celso Frateschi, também versado em Shakespeare, dá vida ao protagonista da vez, o herdeiro divino usurpado de seu poder, Próspero.
Saiba dias e horários do espetáculo
Na trama, Próspero e sua filha Miranda isolam-se numa ilha remota após ele, herdeiro por direito do trono de Milão, ver seu poder roubado pelo irmão, Antônio. Próspero planeja restaurar Miranda ao poder utilizando-se de ilusão e manipulação. Para isso, com a ajuda de Caliban – um homem disforme – e de Ariel – um espírito que pode virar ar ou fogo –, ele convoca uma tempestade para trazer à ilha Antônio e seu cúmplice, o rei Alonso de Nápoles. Lá suas manipulações revelam a natureza vil de Antônio, provocando a redenção do rei, e o casamento de Miranda com o filho de Alonso, Ferdinando. Confira a entrevista com Frateschi, em que fala sobre o espetáculo, Shakespeare e do trabalho com Gabriel Villela.
A peça é muito bonita nesse sentido: não por retratar a realidade, mas por mostrar uma realidade possível"
Celso Frateschi
Você já interpretou outros textos de Shakespeare, e agora atua na última obra que ele escreveu. Você percebeu alguma diferença, além da história, é claro, nesse trabalho? Como se fosse um texto de despedida?
Sem dúvida nenhuma tem essa ideia de despedida muito forte. Ele faz quase que uma revisão de toda sua obra dentro da própria peça. Você percebe a estrutura dos dramas históricos, das tragédias, dos grandes romances, existe quase um “Romeu e Julieta” dentro da história. Existem várias referências às suas próprias peças. E é uma história bastante singular, que tem esse tom de despedida mesmo, os textos, os solilóquios são de uma profundidade, de uma beleza, de uma melancolia tão sublime, tão forte, que é quase um adeus.
Você fez outra versão de 'A Tempestade' quando viveu Caliban e Próspero foi interpretado por Paulo Autran. Você enxerga o texto de uma forma diferente hoje?
A sensação de estudar o texto, de trabalhar, de ensaiar do jeito que a gente ensaiou, de mergulhar tão profundamente no texto e no mundo em que a gente vive, é quase uma outra “A Tempestade” da que eu fiz com o Paulo. Eu me lembro que ficava na coxia vendo o Paulo fazer os solilóquios – que grande ator que ele era, a gente aprendia muito ao observá-lo – e ele se comovia muito a cada noite. Hoje eu percebo que eu também me comovo, mas o texto me pega em outras partes dos meus sentidos. Isso é fantástico no Shakespeare. É um autor que a cada vez que você revisitá-lo, vai ser diferente, ele vai nos servir de uma maneira diferente.
O diretor Gabriel Villela supervisionou todas as áreas do espetáculo (Foto: João Caldas)Gabriel Villela também assina a
cenografia  (Foto: João Caldas)
Você vive Próspero, que quer restaurar seu poder de direito, tomado pelo vil irmão Antônio. Mas ele mesmo possui características autoritárias e é um pouco manipulador, certo?
Ele é um duque poderoso numa sociedade completamente autocrática, em que ele é o herdeiro divino e tem uma ligação direta com Deus. E essa ordem divina foi, de alguma forma, solapada pelo irmão, que assumiu o poder dele. Até aí é uma referência muito grande a todos os outros dramas históricos de Shakespeare, que tem sempre alguém tomando o poder de alguém. E esses dramas históricos têm sempre um mundo muito caótico. A diferença do Próspero é que ele restaura o equilíbrio, quase como uma moralidade, termina tudo em paz. E é uma comédia. Ele tem características autoritárias, mas durante a peça tem um processo de crescimento humano. Mesmo com a vingança pretendida, ele transforma tudo em um grande equilíbrio e perdoa a todos. “Castigar é fácil. Ser magnânimo é onde reside a virtude”, é a conclusão dele. A peça é muito bonita nesse sentido: não por retratar a realidade, mas talvez por mostrar uma realidade possível.
Esse espetáculo parece ser muito artístico no sentido de como foram confeccionados o cenário, o figurino, até mesmo a criação da trilha sonora, tudo em minuciosos detalhes acompanhados pelo diretor. Para você, como ator, como foi esse processo?
Nunca tinha trabalhado com o Gabriel Villela, e foi uma surpresa genial. Gostava muito das suas peças, principalmente “Romeu e Julieta”, que é uma peça antológica. Então foi um grande prazer. Acho que o universo da “A Tempestade” tem até mais a ver com o universo que o Gabriel propõe do que “Romeu e Julieta”. Essa coisa onírica, fantástica que o texto propõe, ele soube lidar de uma maneira muito interessante, puxando isso para a nossa mitologia brasileira. Todas as questões que o Shakespeare coloca na Inglaterra, ele traz para um Brasil que é muito próximo de todos nós. E isso foi muito rico, porque a pesquisa que ele trouxe das músicas, dos objetos, do próprio cenário, tudo é muito brasileiro, ao mesmo tempo em que é universal, porque mexe um pouco com a nossa ancestralidade e supera os limites geográficos e os da nossa divisão política. É uma coisa humana mesmo. Eu fico praticamente todo o espetáculo em cena e vou descobrindo detalhes da luz, dos objetos, do cenário. Me envolvendo cada vez mais na história que estou contando. É muito prazeroso.
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